terça-feira, 9 de novembro de 2010

A última carta a mim mesmo

... Antes de vocês lerem este post, peço que esvaziem seus corações e suas mentes. Ele foi feito com todo meu amor, paixão e empenho, como todos os que são feitos aqui no Sp/Pa. Mas ao contrário dos meus anteriores, que eram mais pessoais, generalistas e restritamente direcionados, o post que segue é uma grande homenagem a todos aqueles que eu pude recortar, desenhar, colar e finalmente costurar em mim. Todas as minhas palavras tentam expressar o que é muito difícil ao fazer arte: a intensidade de um beijo por quem não beija nem é beijado.

Gostaria também que o lessem ouvindo a música que marcou esse semestre final de 2010.

Este é o começo da última carta a mim mesmo, e é assim que eu começo a contá-la para vocês...
Há 5 anos estou aqui. Vir sem nem ao menos saber como eram as árvores foi bastante complicado. O tempo fez o que sabe, passou, aproximou e distanciou. Ele é importante nesta e em qualquer outra história, parece ser dono de si e de todos nós, que como naquelas coisas que entendemos, aceitamos, mas insistimos em brigar, achamos que podemos atrasá-lo ou evitá-lo. Pelo lado bom, o tempo seca as folhas. Quase todos chamam de morte, mas eu, minhas folhas, chamo de secar. Gostaria que vocês também vissem assim. Vocês são folhas, que secam mas servem de alimento para outras e para outros. Quando vocês deixam de existir, permitem a existência de outros, fazendo parte delas e as sustentando. Aqueles que admitem a morte aceitam a ideia de não fazerem parte da existência dos que ficam.

Particularmente, o último ano foi muito especial. O vento soprou sobre a maioria de nós, soprou fraco ainda, mas nos tirou de nossas salas e de perto da maioria de nossos amigos do ano passado. Fizemos novos, mais fortes e nos tornamos cúmplices, de matérias, opiniões, de 12 horas diárias e de todos os dias que o ano pode prover. Vocês sabem que o vento irá soprar, implacável, logo mais. É apenas questão de tempo e não depende de suas vontades. Mas o bonito, com relação ao vento, é sua diferença com o tempo. A vontade de cada uma de vocês é determinante para onde, como e quando o vento irá soprar. Quase todos chamam de livre arbítrio, mas eu, minhas folhas, chamo de vontade. Querendo ou não, o que acontecerá com vocês depende do que fizerem, não? Isso acontece porque mesmo com o vento implacável, todas têm liberdade para planar no ar, dificultarem, ou lançarem-se com mais ímpeto, chegando antes, ou até mesmo se desviando.

Eu conheci religiosas (como ignorar a ignorância milenar e o amor profundo pela tolerância?), liberais (as que mesmo com pouca convivência, pousam ao seu lado e abrem-se ao sol, sem medo de queimaduras nem reflexões mal feitas), doces (tanto na cama quanto com caneta em mãos, hábeis e entregues, daquele tipo que lhe encanta em qualquer coisa que façam), ácidas (de opiniões fortes e lutadoras, que não aceitam desdobramentos nem novos lugares, agressivas mas ainda sim são folhas, e acabam admitindo no final das contas), barulhentas (que viveram boa parte de suas vidas em comunhão com a arte - o que realmente nos torna humanos, porque a racionalidade é uma mera convenção daquelas que nos torna muito simplórios e afastados de nossa essência, enquanto a arte nos une aos dois, à nossa natureza e à nossa natureza) e todos os outros tipos de folhas, daquele tipo que você não sabe como separar, como interjeições errantes que simplesmente surgem em meio à sua vida e aniquilam seus valores, seus ideais e laços.

Entre todas vocês, entre irmãos que ganhei em sangue, suor e técnica, espírito, corpo e dedicação - as grandes folhas do judô - as grandes folhas do rock, as grandes folhas do meu antigo prédio, do meu antigo colégio, e as especiais novas folhas desse derradeiro ano de colegial. Entre todas vocês, eu ajoelhei-me e escolhi, uma a uma, aquelas que eu gostaria de costurar à minha carne, fazendo de mim uma colcha de retalhos de todas vocês. Lembranças, gostos, ideias e objetivos, todos nós compartilhamos vários destes, e iremos difundi-los até o final de nossas existências.

Muitos de vocês, afinal de contas, não sabem minha história. Alguns sabem de meu QI, de minha capacidade de organizar pensamentos de todos os gêneros e exercer todas as habilidades possíveis de maneira invejável, sabem que não sei nadar, dançar nem andar de bicicleta. Sabem que se reencarnações existem, Casanova foi um dos que tropeçaram em mim e deixou seu espírito apaixonado e apaixonante vivo comigo. Conhecem algumas de minhas desventuras amorosas, a interpretação de muitos de meus textos, e já ouviram algumas de minhas letras. Partilharam de pensamentos que foram evoluindo do agnosticismo ferrenho à sensação de liberdade (marcada à pele) liberalista em todos os sentidos. Sabem de minha infância conturbada e tumultuada por mudanças, que nunca serviram de desculpa para nenhuma de minhas ações. Também sabem que tenho por essência centralizá-las em mim, desvinculando-as de terceiros ou entidades quaisquer. Sabem que me gabo pelos prós e sofro silenciosamente pelos contras de se ser assim.

Mas apesar disso parecer muito sobre uma pessoa, ainda está longe de ser a minha história. Penso que é impossível conhecer alguém de verdade e totalmente. E que se você quiser ao menos entender a história e as ações de alguém, basta você ter duas coisas: a capacidade de relativizar e saber aquilo que a pessoa acredita. O que nós acreditamos faz de nós o que seremos. Pois baseamos nossas ações e consequentemente nossos objetivos em valores.

Eu sempre entoei dizer que não acreditava em nada... e isso não é verdade. Eu acredito em apenas uma coisa, minhas folhas, eu acredito no amor. Acredito no amor de cada um de vocês, e na maneira com que podem usá-lo para conseguirem e se tornarem o que quiserem. O que nos torna capazes de fazer arte, é o amor. O que torna os homens capazes de se unir às mulheres, melhores em quase todos os aspectos, é o amor. Embora nem sempre demonstre, eu acredito piamente naquilo que cada um de vocês guarda e externaliza, porque é isso que dá a todos vocês a beleza em não optar por sofrer por um deslocamento pelo vento, ou felicitar por conhecer coisas novas. Isso é o que torna todos vocês humanos, que existem, secam, têm vontades e paixões. Vocês são como as folhas, e eu não assumo e nunca pretendo ser vinculado a um possível jardineiro - embora alguns de vocês me vejam assim. Nós todos estamos submetidos a um mesmo vento, que nos obriga a nunca parar de voar por muito tempo... e chegou a minha hora de voar. Em breve chegará a hora de todas vocês. Mas não fiquemos tão tristes. Quem sabe quando o vento tomará outra direção, e nós estaremos juntos mais uma vez, mesmo que em posições, colorações e estados diferentes? Quem sabe? Bem, eu ainda não sei. E por procurar essa e outras respostas, eu preciso seguir em frente. A última carta a mim mesmo termina aqui, já que agora eu levo cada um de vocês comigo... nervura por nervura.

P. s. : Vocês realmente me enganaram direitinho ontem, no único ponto em que poderiam: no amor. Não desconfiei um segundo da surpresa... muito obrigado, amigos!
P. s. 2 : É, agora finalmente o Sp/Pa Connection faz jus ao seu nome de fato. Que comece a nova fase de nosso blog!


quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Primeiro parágrafo

E o vento soprou. Pouco a pouco todas as folhas levantam voo, ricocheteiam no ar, entre elas, comigo, e caem. Passei os últimos anos tentando decidir entre a beleza de se sair de um lugar para alcançar um novo com novas folhas e a tristeza de deixar as folhas antigas, devido à força do vento que lhe arrasta para longe delas. Enquanto as folhas caem, uma a uma, começo a me dar conta sobre a importância de cada uma delas para mim. Na última vez, a cidade mantinha tons de cinza, de monotonia e introspecção. Agora minha inspiração se deve unicamente ao fantástico brilho de cada uma dessas folhas... e chegou a hora de contá-las nervura por nervura. Este é o começo da última carta a mim mesmo, e é assim que eu começo a contá-la para vocês...

P.