quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Gil Rosa.

Eu sou apenas mais um dos que andam com fome. Dos que nem conseguem mais andar, apenas se arrastam pelas ruas, pelas calçadas e pelas casas abandonadas. Que já não consegue mais nem se arrastar sozinho, apenas regado a um uísque, que talvez seja o culpado de eu ter perdido minha casa e minha família, talvez até minha destreza prejudicada seja prejuízo dessa garrafa. Mas, quer saber? Não ligo se a culpa é dele, de todos meus amigos ele é o único que não derrama nada de sua boca que me difame. Que não chega perto do meu bolso e tente colocar esmolas. Que não me dá calor de raiva nas chuvas, por falar mal, achar que o que eu preciso é dinheiro e deixar os outros em paz. Não é que eu os incomode, não digo sobre meus amigos, nesse caso, eles já me deixaram há muito tempo, foram com minha esposa e minhas filhas, mas eu falo mesmo é dos que não conheço, que sempre vejo. Eu sou um remanescente da época vermelha, época abyte, onde os jovens não tinham outra paixão sequer por suas ideias. Hoje não fazem ideia do que é paixão por coisas imaterias, amam apenas o que os outros amam, sem amar a quem os ama.

Eu sou apenas mais um poeta de rua, que excumunha ao mundo como Gil, o Vicente, e que diz amar a todos que me amem por alguns minutos, se amar é respeitar, respeitar é saber ouvir... Quando me dão ouvidos, me dão muito mais amor do que as pessoas que seguram em minhas pernas pedindo para que eu não escorregue e me machuque. Eu sou como uma rosa, em papéis de aniversário, anagramas e poesias de meus amigos dos velhos tempos, dos tempos dourados e negros. Mas não desse tempo vazio. Onde os jovens adoram coisas antigas, por que grandes ídolos não existem de verdade. Não mais. Um dos meus grandes amigos diz que seus heróis morreram de overdose. Seus inimigos ainda estão no poder. O que me restou para viver são as coisas que não têm como me deixar. É complicado perceber que só está próximo de você o que não tem outra escolha. Por que simplesmente não sente nada. Os que sentem são os que me dão ouvidos. Prefiro acreditar que aqueles que me abandoram não podem sentir lá tanta coisa assim.

P., nessas férias, numa madrugada chuvosa, na virada do aniversário de um amigo, cercado de amigos e amigas, encontramos essa figura, que nos rendeu um momento maravilhoso e inesquecível. Um poeta das antigas com coração vermelho, que bate no lado esquerdo do peito e como os caras da direita nunca vão entender. Hoje, sem tanto esquerdismo e direitismo assim, nós somos os tolos que não entendem. Os tolos que se acostumaram a entender das coisas e não das pessoas. De preconceitos e não de seres fantásticos que escolhem ou foram escolhidos para morar no mundo. Sem nada além de si mesmos, que nem é tanta coisa assim, já que o mundo, esperam eles, reserve seu reencontro com sua paz. Enquanto não se encontram, nós lhe damos ouvidos... e todo nosso amor.

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