Eram dois. Uma com não mais de nove anos. Outro, com a idade que aparenta mesmo ter. E como aparências são pessoais, tanto faz a idade que ele realmente tiver, você dará a que quiser. Estavam sentados, em um banco que os separava por um abismo que tinha nome, experiência. Não só um buraco relativo, mas uma cratera física em que ela caiu. Segue abaixo:
- Seus pais te amam e vão superar as diferenças a um nível, ao menos, tolerável, pra te deixar feliz.
- Não foi isso que eu perguntei.
- Você não perguntou nada. Você perguntou tudo. Quando se responde com um “por que”, posso responder o que eu bem entender como “porque”.
- Que seja. Eu quero saber se eles me amam, assim como os pais de minhas amigas, porque há ódio, raiva, brigas... O amor é uma coisa boa, pelo menos foi o que sempre aprendi. Não deveria nos fazer tanto mal...
- É...
- Pra mim, o ódio é ausência de amor.
- Na verdade são coisas muito parecidas... é óbvio que o ódio é ruim e o amor é bom. Mas a linha que os separa, embora sejam coisas aparentemente difusas, é tênue...
- Isso é um clichê barato.
- Você por acaso sabe o que quer dizer a palavra “clichê”?!
- Não, não sei. Eu vi essa resposta para o que você disse num filme...
- E porque você não perguntou a ninguém o que queria dizer, mocinha?
- Não havia ninguém comigo vendo o filme. Depois esqueci de perguntar pra outra pessoa.
- Você não deveria ver um filme sozinha, nessa idade! O cinema tem muitas coisas que não são pro bico de crianças.
- Não adianta me colocar dentro de um casulo protetor. A força de fora que ataca para romper o casulo é a mesma da minha que ataca de dentro, portanto, nos anulamos. O casulo continua lá, intacto.
Senti-me desconfortável em não distinguir se a garotinha estava fazendo uma piada usando a lei da força resultante da física em relação a sua inocência. Mas fazia sentido. Assim como sua vontade de romper o casulo era enorme, para descobrir o mundo e coisas de “adultos”, a mídia e o sistema precisavam dela preparada para essas coisas o mais cedo possível. Incentivando a pornografia, obrigações ambientais e econômicas, intelectuais e patrióticas, também forçavam o casulo de fora para dentro. As forças deveriam se anular, e o casulo permanecer intacto, é o que a Lei diz.
- Isso também é mentira.
- Por quê?
- Pois seu casulo nunca existiu de fato. Não teve tempo para ser tecido corretamente, e sobram muitas lacunas. Ninguém pode tecer um casulo protetor invulnerável. Sua força ultrapassa o casulo, assim como a que vem de fora. Se você julga seu casulo como sua inocência, ela nunca existiu de fato. Não forte o suficiente. Era apenas provisória, até que o curso natural, você rompendo, e o imposto, o artificial, a força exterior forçando, consigam destruir grande parte dele.
- Você está dizendo que eu não sou inocente?
- Quanto é dois mais dois?
- Eu disse inocente. Não ignorante.
- São sinônimos.
- Sim, talvez até seja. Mas não era exatamente nesse contexto que eu me inseri.
- Foi na conotação sexual?
- Sim, esse tipo de inocência.
- Então você interpretou o meu sentido de inocência como isso?
- É, nesse sentido.
- Pois seja. Você não é inocente.
P., anocente.
- Seus pais te amam e vão superar as diferenças a um nível, ao menos, tolerável, pra te deixar feliz.
- Não foi isso que eu perguntei.
- Você não perguntou nada. Você perguntou tudo. Quando se responde com um “por que”, posso responder o que eu bem entender como “porque”.
- Que seja. Eu quero saber se eles me amam, assim como os pais de minhas amigas, porque há ódio, raiva, brigas... O amor é uma coisa boa, pelo menos foi o que sempre aprendi. Não deveria nos fazer tanto mal...
- É...
- Pra mim, o ódio é ausência de amor.
- Na verdade são coisas muito parecidas... é óbvio que o ódio é ruim e o amor é bom. Mas a linha que os separa, embora sejam coisas aparentemente difusas, é tênue...
- Isso é um clichê barato.
- Você por acaso sabe o que quer dizer a palavra “clichê”?!
- Não, não sei. Eu vi essa resposta para o que você disse num filme...
- E porque você não perguntou a ninguém o que queria dizer, mocinha?
- Não havia ninguém comigo vendo o filme. Depois esqueci de perguntar pra outra pessoa.
- Você não deveria ver um filme sozinha, nessa idade! O cinema tem muitas coisas que não são pro bico de crianças.
- Não adianta me colocar dentro de um casulo protetor. A força de fora que ataca para romper o casulo é a mesma da minha que ataca de dentro, portanto, nos anulamos. O casulo continua lá, intacto.
Senti-me desconfortável em não distinguir se a garotinha estava fazendo uma piada usando a lei da força resultante da física em relação a sua inocência. Mas fazia sentido. Assim como sua vontade de romper o casulo era enorme, para descobrir o mundo e coisas de “adultos”, a mídia e o sistema precisavam dela preparada para essas coisas o mais cedo possível. Incentivando a pornografia, obrigações ambientais e econômicas, intelectuais e patrióticas, também forçavam o casulo de fora para dentro. As forças deveriam se anular, e o casulo permanecer intacto, é o que a Lei diz.
- Isso também é mentira.
- Por quê?
- Pois seu casulo nunca existiu de fato. Não teve tempo para ser tecido corretamente, e sobram muitas lacunas. Ninguém pode tecer um casulo protetor invulnerável. Sua força ultrapassa o casulo, assim como a que vem de fora. Se você julga seu casulo como sua inocência, ela nunca existiu de fato. Não forte o suficiente. Era apenas provisória, até que o curso natural, você rompendo, e o imposto, o artificial, a força exterior forçando, consigam destruir grande parte dele.
- Você está dizendo que eu não sou inocente?
- Quanto é dois mais dois?
- Eu disse inocente. Não ignorante.
- São sinônimos.
- Sim, talvez até seja. Mas não era exatamente nesse contexto que eu me inseri.
- Foi na conotação sexual?
- Sim, esse tipo de inocência.
- Então você interpretou o meu sentido de inocência como isso?
- É, nesse sentido.
- Pois seja. Você não é inocente.
P., anocente.
O melhor, por enquanto. =)
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